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PrEP: precisamos falar sobre a Profilaxia Pré-Exposição ao HIV

O farmacêutico homeopata Jamar Tejada explica detalhadamente o que é a PrEP, como ela atua no corpo, para quem o tratamento é indicado e onde conseguir os medicamentos

PrEP: precisamos falar sobre a Profilaxia Pré-Exposição ao HIV
PrEP: precisamos falar sobre a Profilaxia Pré-Exposição ao HIV – Foto: Michał Parzuchowski/Unsplash

Quem acompanha minha coluna sabe que, quando falo sobre algum medicamento, são sobre produtos naturais. Mas o mundo avança e precisamos nos adaptar ao seu movimento, devemos estar abertos a sociedade, a ciência, a evolução e por isso acho bem pertinente falar sobre a “PrEP”, tão popular entre homens gays, mulheres trans e travestis, e tão desconhecido por outros. O fato é que mesmo os que fazem uso tem muitas dúvidas, e como farmacêutico tenho a função de esclarecer, não é mesmo?

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O que é a PrEP?

Embora a orientação – inquestionável e mais eficaz – para a prevenção do HIV seja o uso do preservativo, a realidade nos mostra fatos bem diferentes. Infelizmente, é raro encontrar alguém que faz uso de preservativo. Aliás, eu estava agora pensando, nesse Carnaval por acaso você viu alguma propaganda falando sobre uso de preservativos? Eu não!

Vale ressaltar que existem mais de um milhão e meio de pessoas que vivem com HIV no Brasil, segundo dados do Ministério da Saúde. Isso mostra como é importante o tratamento para as pessoas que vivem com o vírus.

Disponível no SUS desde 2018, a PrEP é indicada para qualquer pessoa sexualmente ativa acima de 15 anos que esteja em risco de contato com o vírus. Mas, ainda que a PrEP seja capaz de proteger em 95% contra o HIV, não é todo mundo que se adapta a ela.

No seu formato clássico, a PrEP consiste em dois medicamentos combinados (tenofovir e entricitabina) que devem ser tomados continuamente todos os dias. Acontece que, muitas pessoas não querem, não conseguem ou nem mesmo precisam tomar o remédio diariamente, já que praticam apenas atividades sexuais esporádicas. É aí que entra a PrEP sob demanda.

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Bom, primeiramente PrEP significa Profilaxia Pré-Exposição ao HIV e é um método de prevenção à infecção única e exclusiva pelo HIV, ou seja, a PrEP não protege contra outras infecções sexualmente transmissíveis (IST) e muito menos gravidez. Acredite, há quem pense que também seja anticoncepcional.

A PrEP consiste na utilização de antirretrovirais por pessoas que não estão infectadas pelo HIV, mas que se encontram altamente vulneráveis ao vírus, logo a PrEP é uma medida profilática e não de cura do HIV. Então, o certo é falar que se está fazendo PrEP ou ainda que se está “em PrEP”, ok?

Além dos remédios de ingestão por via oral, a PrEP também pode ser realizada a partir de um medicamento injetável, chamado cabotegravir, aprovado pela Agência Nacional da Vigilância Sanitária (Anvisa) para uso no Brasil.

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Como funciona o tratamento?

Ele bloqueia a entrada do vírus HIV no DNA das células de defesa do organismo, impedindo a sua replicação. A taxa de eficácia é de até 99%, segundo os estudos clínicos, se tomado corretamente. A indicação é de um comprimido que deve ser tomado regularmente uma vez ao dia e sem interrupções.

Ele atua como uma vacina?

Não, quando você toma uma vacina, seu organismo é estimulado a desenvolver uma proteção que evita adquirir a doença. Ainda no caso da vacina, ela pode te proteger por muito tempo ou mesmo a vida inteira. Na PrEP, a proteção é fornecida pelo medicamento que você toma diariamente, que bloqueará caminhos que o vírus percorre para infectar uma pessoa. Assim, se você deixa de tomar o medicamento todos os dias, ele deixará de funcionar e não te protegerá contra o vírus do HIV.

O uso da PrEP exclui a necessidade do preservativo na relação sexual?

Não. Deve ser um complemento a outras estratégias de prevenção, assim como a camisinha e o aconselhamento médico. O preservativo é ainda a forma mais eficaz para proteger contra o HIV e evitar o contágio por outras doenças sexualmente transmissíveis, como a sífilis e a hepatite B.

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É seguro? Tem efeito colateral?

A frequência de efeitos colaterais da PrEP é baixa, geralmente ocorrem na fase inicial de uso e tendem a desaparecer nos primeiros meses. Os efeitos colaterais mais frequentes visto nos estudos de PrEP foram dor de cabeça, dor de estômago, perda de apetite, náuseas, flatulência, vômitos, tonturas, fadiga, dor nas costas e aumento leve de transaminases (enzimas presentes no fígado). Não foram observados outros efeitos adversos graves.

Se você iniciar PrEP, deverá informar seu médico se sentir esses ou outros sintomas de forma grave ou não se eles não passarem.
Há também efeitos colaterais de longo prazo. Houve casos raros em que a PrEP causou danos aos rins. Nessas situações, o uso do medicamento foi suspenso para que os rins voltassem a funcionar normalmente. Logo, os usuários de PrEP devem realizar exames de urina periodicamente.

Há dados que mostram que uma das drogas usadas na PrEP, o tenofovir, pode enfraquecer os ossos nas pessoas que o utilizam para tratamento do HIV. No entanto, nenhum estudo demonstrou que as pessoas que o usam para PrEP tenham problemas com fraturas patológicas (quando o osso quebra em situações em que não deveria quebrar). Portanto, não são necessários exames de ossos.

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Quem pode usar?

PrEP não é para todos. Os médicos prescrevem PrEP para pessoas que tenham uma maior chance de entrar em contato com o HIV. Para algumas populações que têm sido historicamente vulnerabilizadas à infecção pelo HIV, o risco de uma única relação sem preservativo é maior.

Portanto, no SUS, por questões de priorização, a PrEP poderá ser disponibilizada para pessoas HIV-negativas das seguintes populações (veja protocolo nacional, p. 17):

  • Homens gays, bissexuais e outros homens que fazem sexo com homens;
  • Pessoas trans (mulheres transexuais, travestis, homens trans e pessoas não-binárias);
  • Profissionais do sexo ou pessoas que eventualmente recebam dinheiro ou benefícios em troca de serviços sexuais;
  • Pessoas que estejam se relacionando com uma pessoa vivendo com HIV (casais sorodiferentes). Portanto, no caso de casais sorodiferentes que queiram fazer sexo sem camisinha, o parceiro HIV-negativo tem autonomia para decidir se tomará a PrEP ou se usará como método de prevenção a indetectabilidade do parceiro.

Devemos perceber que a sociedade de modo geral tem repensado os modelos de relacionamento. Hoje estamos numa fase “multicasais” onde muitas relações são abertas e poligâmicas. Além desses, às mulheres mais liberais, que passam a se aventurar no swing ou em ménages, também cabe o uso da PrEP.

Mulheres cisgênero e outras pessoas com vulva podem fazer uso?

Desde a disponibilização do método, mulheres cisgênero e outras pessoas com vulva que estejam vulneráveis ao contágio podem ter acesso. É o caso das que são trabalhadoras sexuais ou estão em relações sorodiferentes (em que uma pessoa tem HIV e a outra não).

Mas, no Brasil, o acesso e a divulgação foram centrados, inicialmente, em pessoas com pênis, como homens gays ou hétero e algumas mulheres trans e travestis por serem considerados os grupos mais expostos.

Segundo o Departamento de HIV/AIDS, Tuberculose, Hepatites Virais e Infecções Sexualmente Transmissíveis da SVSA, 3.060 mulheres cisgênero começaram a usar o método em 2022. Por mais que signifique um número bem menor em comparação aos homens cis, implica um aumento de 55% em relação ao registrado em 2022. Elas são a segunda população que mais adere à PrEP no país, atrás apenas dos homens gays, que representam mais de 84% do público.

O uso é similar ao do anticoncepcional e também depende da adesão consistente para fazer efeito. Depois dos primeiros 20 dias, que é o tempo necessário para que a mucosa vaginal absorva a substância, o corpo já está preparado para barrar a entrada e propagação do HIV, caso seja exposto. O que garante essa ação é a combinação dos medicamentos tenofovir desoproxila e entricitabina, que impedem que o vírus se multiplique ao entrar no organismo e faz com que possíveis células infectadas sejam descartadas pelo sistema imunológico.

Posso parar de usar preservativo?

Se for tomada diariamente, a PrEP é muito segura para proteger da infecção pelo HIV. Mas, repetindo: ela não protege de gravidez e de outras infecções sexualmente transmissíveis, tais como sífilis, clamídia, gonorreia, hepatites e infecção por HPV. Você poderá ter uma maior proteção contra o HIV e outras infecções sexuais se tomar PrEP diariamente e usar preservativos durante as relações sexuais.

Se você não utilizar camisinha em alguma das suas relações, é importante que observe o surgimento de qualquer sintoma ou sinal que indique uma possível infecção sexualmente transmissível, como um corrimento, verrugas, feridas ou ardência no pênis, vagina, ânus ou na boca. Se notar algo diferente, é melhor ir ao médico o mais rápido possível para evitar que uma possível doença se agrave e que você transmita a doença para algum(a) parceiro(a) sexual. É importante também utilizar um método anticoncepcional.

Terei que tomar para sempre?

Não. Se o risco de se infectar pelo HIV diminuir por causa das mudanças que ocorrem em sua vida ou se você achar que não tem mais sentido tomar PrEP, como mudanças na vida sexual ou no status de relacionamento, não há uma obrigatoriedade em seguir o tratamento.

Além disso, você pode não querer mais tomar um comprimido todos os dias e avaliar outros métodos de prevenção que funcionem melhor para a sua realidade. É possível que você venha a apresentar efeitos colaterais da medicação que atrapalhem seu dia a dia e/ou que persistam após os meses iniciais de uso.

Independentemente do motivo para deixar de tomar a PrEP, é importante que você conversar com seu médico antes de tomar essa decisão.

O que é a PrEP sob demanda?

A PrEP sob demanda é uma alternativa para aquelas pessoas que têm relações sexuais com frequência menor do que 2 vezes por semana. A medicação é a mesma, o que muda é a forma de tomar. Ao invés de vez de ser diário, o esquema se inicia com dois comprimidos que devem ser tomados de 2 a 24 horas antes da exposição sexual, seguidos de 1 comprimido após 24 horas e 1 comprimido após 48 horas.

Se houver mais de uma relação nesse período, o ideal é tomar o último comprimido após 48 horas da última relação. Ou seja, se uma pessoa tiver atividades sexuais na sexta, sábado e domingo, ela deve tomar 2 comprimidos em até 2 horas antes da primeira exposição, seguido de um comprimido por dia até que se complete 48 horas após a última relação — nesse caso, na terça-feira.

Quem pode tomar a PrEP sob demanda?

A PrEP sob demanda é indicada para:

  • Homens cisgênero (que se identificam com o gênero atribuído ao nascimento), independentemente da orientação sexual;
  • Pessoas não binárias designadas do sexo masculino ao nascer;
  • Travestis e mulheres transsexuais que não estejam em terapia hormonal com estradiol.

Ela não é indicada para mulheres cisgênero e pessoas não binárias designadas do sexo feminino ao nascer por causa do tempo necessário para o medicamento agir na mucosa vaginal, como citei acima. E no caso de mulheres trans ou travestis em terapia hormonal à base de estradiol, esse hormônio pode interagir com os antirretrovirais da PrEP, reduzindo a eficácia da proteção.

Onde conseguir?

Se você acha que esse esquema é o ideal para a sua realidade, procure pela Rede Municipal Especializada, como os SAEs (Serviço de Atendimento Especializado), os CTAs (Centro de Testagem e Aconselhamento) ou até mesmo uma UBS (Unidade Básica de Saúde).

A prescrição dos medicamentos depende da avaliação de um médico clínico ou infectologista e, uma vez iniciado o esquema preventivo, o acompanhamento acontece em intervalos de até 120 dias com avaliação clínica, testagem rápida e realização de exames, se necessário.

Onde posso saber mais?

Disque DST-Aids: 0800-16 25 50
Conversaria Sem Tabu
Facebook (responde Inbox)
WhatsApp: (11) 99130-3310