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Em sua coluna, Jamar Tejada fala sobre a relação entre o consumo de doces e o vício em açúcares
Em sua coluna, Jamar Tejada fala sobre a relação entre o consumo de doces e o vício em açúcares – Pexels

Você é daqueles que não pode ficar sem um docinho? Assim que vê aquele brigadeiro, pudim ou bolo de cenoura com cobertura de chocolate, começa a salivar e fica praticamente cego a tudo que está ao redor? Seu foco se torna único e exclusivo a esse prato que está na sua mira? Se sim, você se julgaria um viciado?

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Enquanto a Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda que a ingestão de açúcar não ultrapassasse 10% das calorias diárias, o brasileiro atinge patamares próximos aos 16%. Esse consumo elevado é proveniente não só do açúcar de adição, mas também de alimentos ultraprocessados, como as bolachas recheadas, barras proteicas, chocolates, bolos industrializados, iogurtes, bebidas esportivas, águas vitamínicas, entre outros.

Uma pesquisa realizada pelo Ministério da Saúde aponta que os brasileiros consomem, em média, cerca de 80 gramas de açúcar por dia – o que equivale a cerca de 20 colheres de chá. Esse alto consumo de açúcar tem sido associado, principalmente, a um aumento nas taxas de obesidade, diabetes e outras doenças crônicas no país, como hipertensão, doenças metabólicas e até mesmo câncer. É para se preocupar, não é mesmo?

Vício em açúcar é o mesmo que vício em outras drogas?

Você já deve ter ouvido que o açúcar vicia tanto quanto a cocaína. Essa teoria surgiu em 2016 num estudo realizado pela Universidade de Queensland, na Austrália, que mostrou com ratos que a mesma região do cérebro ativada com cocaína é ativada com açúcar, por um sistema de recompensa.

Mas essa mesma região é ativada com tudo que gera prazer, como um abraço, beijo, sexo, etc. Então, quando comemos um docinho, o sistema de recompensa – chamado de sistema dopaminérgico mesolímbico – é ativado. A dopamina é uma substância química liberada pelos neurônios e que sinaliza que um evento foi positivo. Quando o sistema de recompensa dispara, ele reforça comportamentos, tornando provável que realizemos essas ações novamente.

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Outro estudo realizado em Princeton em 2008 verificou que os ratos podem se tornar dependentes de açúcar e que essa dependência pode estar relacionada a vários aspectos do vício, como ânsias, compulsão alimentar e abstinência. Essa resposta explica as razões pelas quais muitas pessoas têm dificuldades em abandonar o consumo de produtos industrializados e doces.

É claro que os efeitos provocados por drogas são muito diferentes dos efeitos causados pelo consumo de doces, mas ainda há confusão sobre esse tema porque existem estudos científicos que, ao invés de avaliar questões ligadas ao vício, acabam focando em aspectos comportamentais de transtornos alimentares – e nisso há uma grande diferença.

Não precisa se trancafiar em um quarto ou se enfiar em uma clínica de recuperação para se livrar do vício de doces. Mas também não estou dizendo que é fácil, ok?

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Da barra de chocolate ao pedaço de fruta

Essa preferência por um sabor mais adocicado e a recusa em aceitar alimentos novos é um mecanismo que vem desde os nossos ancestrais, um sistema evolutivo chamado neofobia alimentar. O sabor dos alimentos nos servia como alerta, se o alimento estivesse estragado teria gosto amargo e se o sabor fosse doce era um sinal positivo. E, na verdade, usamos esse mecanismo até hoje. Quem não coloca a ponta da língua em um alimento para testá-lo?

É interessante saber que esse contato com o doce já é instigado desde o nosso nascimento, já percebeu que nosso primeiro contato alimentar é o leite materno? E o carboidrato do leite tem esse sabor mais adocicado, daí então já começa essa preferência pelos doces. Não estou dizendo que é errado o leite materno – de forma alguma! O errado na infância é compensar uma boa ação com um doce. Por que não compensar seu filho com uma fruta?

Carboidrato é um macronutriente formado fundamentalmente por moléculas de carbono, hidrogênio e oxigênio. Este macronutriente, quando ingerido e absorvido, é responsável por liberar glicose, fornecer energia para as células (por ser a primeira fonte de energia celular) e fazer a manutenção metabólica glicêmica para que o corpo continue funcionando bem.

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Já o açúcar é um nome mais comum dado a alguns tipos de carboidratos, como sacarose, glicose e frutose e pode ser consumido de várias formas, da barra de chocolate a um pedaço de fruta. Por ser um carboidrato, apesar de não possuir nutrientes, acaba sendo uma fonte de energia para o corpo.

Prejuízos do açúcar

Muitos acreditam que o diabetes seja o único ou o maior problema do açúcar, mas como já devem ter percebido, é apenas mais um. A glicose sanguínea elevada também prejudica os vasos sanguíneos do organismo e isso leva a inúmeros problemas.

Quero citar ainda os efeitos do açúcar ao nível cerebral. Vários estudos com diabéticos a longo prazo mostram danos cerebrais progressivos, levando a déficits no aprendizado, memória, velocidade motora e outras funções cognitivas. A exposição frequente a altos níveis de glicose diminui a capacidade mental, levando até a um possível encolhimento do cérebro.

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Mesmo àquelas pessoas sem diabetes, o maior consumo de açúcar está associado a pontuações mais baixas em testes de função cognitiva. Acredita-se que esses efeitos sejam motivados pela combinação de hiperglicemia, hipertensão, resistência à insulina e colesterol elevado.

O hipocampo, nosso “centro” de memória, é afetado também diretamente pelo açúcar. Uma pesquisa publicada no Learning & Memory mostra que ratos que comem dietas com alto teor de açúcar reduzem as chances de lembrar se já viram objetos em locais específicos, por exemplo. Conforme a pesquisa, mudanças induzidas pelo açúcar no hipocampo se relacionam à redução da formação de novos neurônios, os quais são de extrema importância para codificar as memórias. Acesse o estudo da pesquisa clicando aqui.

Outro ponto importante é a inflamação, já que pesquisas também sugerem que o alto consumo de açúcar possa ocasionar inflamação cerebral, levando à ocorrência de dificuldades de memorização. Um estudo publicado na Bhavioral Brain Research em 2016 descobriu que marcadores inflamatórios estavam presentes no hipocampo de ratos alimentados com uma dieta rica em açúcar, mas não naqueles alimentados com uma dieta padrão. Veja o estudo na íntegra clicando aqui.

Relação entre o consumo de açúcar e o humor

E não para por aí. O açúcar também está intimamente relacionado com nosso humor.

Um estudo de análise do consumo alimentar e do humor realizado 23.245 indivíduos inscritos no estudo Whitehall II, descobriu que taxas mais altas de consumo de açúcar estavam associadas a uma maior incidência de depressão. Em 2017, a pesquisa foi publicada na revista Scientific Reports e relatou que indivíduos com níveis elevados de consumo de açúcar tinham 23% mais chances de serem diagnosticados com um transtorno mental do que aqueles com o menor consumo. Veja o estudo na íntegra aqui.

Como devem ter notado, os prejuízos não são poucos e o preço a se pagar é alto demais. Espero que a partir dessa leitura, você comece a repensar seus hábitos e a se questionar: “Por que tanto doce?”, ou “O doce na minha vida serve como consolo?.

Eles até podem melhorar nosso humor, mas temporariamente. O prejuízo é muito maior que a recompensa. Na maioria dos casos, rever seus sentimentos é a melhor estratégia.

Eliminar os carboidratos da dieta também não é tarefa fácil, mas tem como reduzir sua ingestão ao evitar alimentos industrializados, principalmente a farinha branca. Beber mais água também é fundamental, pois nosso cérebro confunde desidratação com fome. Além disso, ingerir mais proteínas garante saciedade por mais tempo e ajuda a resistir ao impulso do docinho.

Enfim, mude velhos hábitos como a da sobremesa, renuncie a ela por três semanas para readaptar o paladar e diminuir a compulsão e resista ao impulso de comer por qualquer problema que surja, seja porque está nervoso, triste ou por simples hábito.

Lembre-se: alimento é fonte de vida, trate-se com respeito, saiba selecionar o que é positivo para você e o que for ruim, saiba mandar para bem longe. Boa sorte!