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No Dia do Combate à Intolerância Religiosa, teólogo e espiritualistas de diferentes crenças opinam sobre a luta contra este preconceito

O teólogo Rodrigo Moraes e as espiritualistas Cigana Kélida e Juliana Viveiros falam sobre a origem do preconceito e relatam momentos de intolerância que vivenciaram

No Dia do Combate à Intolerância Religiosa, teólogo e espiritualistas de diferentes crenças opinam sobre a luta contra este preconceito – Pexels / Flickr / Pixabay

Em 21 de janeiro celebramos o Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa. A data serve como alerta para seguirmos lutando a favor do respeito mútuo não somente entre as pessoas que seguem crenças diferentes por todo o país, mas para com os espaços que os indivíduos utilizam para suas expressões religiosas ou espirituais.

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A data oficializada em 2007 homenageia Mãe Gilda, do terreiro Ilê Axé Abassá de Ogum, em Salvador, acusada de charlatanismo por adeptos de outra religião. No incidente, ocorreram agressões físicas e verbais, além de um ataque ao seu terreiro. Combativa, ela não deixou que as agressões afetassem sua fé. Vale lembrar que as religiões de matriz africana são os maiores alvos de intolerância religiosa no país.

Teólogo e espiritualistas opinam sobre a luta contra a intolerância religiosa

Como fundamenta o teólogo calvinista Rodrigo Moraes, pastor de uma comunidade evangélica há 16 anos: “O Brasil está sempre fundamentado na consciência de maioria. A religião cristã, por exemplo, por ser majoritária no país, acaba se percebendo como hegemônica, e portanto, no direito de exercer preconceito com as demais religiões”, assim como ocorrem com o candomblé e umbanda.

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Como podemos caracterizar um intolerante religioso, então? Como enquadrar essas pessoas, de uma maneira geral? “Penso que todo fanático é um intolerante, e todo intolerante, no fundo, é um fanático. O que difere um do outro é que o fanático pensa em proselitismo religioso, para que todos abandonem a ‘falsa religião que professam’ e comecem a fazer parte da ‘única religião verdadeira’. Enquanto o intolerante, ao invés de pensar na conversão do outro, pensa em denegrir ou até mesmo destruir as crenças que diferem da sua.”, diz o teólogo.

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A espiritualista Kélida Marques, conhecida popularmente como Cigana Kélida, afirma que a intolerância em meio às religiões está relacionada com o ego. “O ser humano é muito ligado ao status, classes, hierarquias. O mesmo acontece na religião. A falta de conhecimento traz os julgamentos e o linchamento de determinadas crenças.”

Cigana ainda afirma que as críticas feitas ainda hoje se dão pelas escrituras feitas por homens, não por Cristo, não por Deus. Os homens “que na época que escolhiam quais escritos iam para o livro sagrado, agiram de acordo com suas necessidades e interesses”.

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Para a também espiritualista Juliana Viveiros, do portal online iQuilíbrio, a intolerância está no olhar feio, nos xingamentos, nos preconceitos, julgamentos, naqueles que não entendendo ou até mesmo conhecendo sua crença, insiste em se sentir melhor, maior que o outro — voltando ao “status” citado por Kélida.

“Estamos todos em um mesmo plano, nessa dimensão, nessa terra, nessa contagem de tempo. Não há certo ou errado, há pessoas tentantes. Não há o bonito ou o feio, existe modo diferente de fazer as coisas”, afirma a espiritualista.

Juliana diz também que a espiritualidade vai além da religiosidade, e é ela que devemos buscar para divergir ainda mais da intolerância religiosa. “Um religioso pode ser espiritualizado, mas nem sempre um espiritualizado é religioso”, diz.

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Para Juliana, aquele que estuda, busca conhecimento e consegue colocar acima de tudo o amor, a gratidão ou técnicas capazes de transformar sua vida e das pessoas, pratica a espiritualidade, mas não é necessariamente um religioso. E o contrário também pode acontecer: uma pessoa cristã frequentando os cultos ou missas, orando, fazendo o bem, se dedicando em seus estudos bíblicos, também é considerado um espiritualizado, caminhando naquilo que a religião ensina.

Lidando com a intolerância religiosa

Seguidora de religião de matriz africana, Cigana Kélida conta que quando começam a tocar os atabaques em sua casa espiritual, reclamações acontecem. Um vizinho, inclusive, chegou a colocar uma música gospel em alto e bom sol, numa tentativa de abafar o som do instrumento de percussão usado nos terreiros.

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“Certa vez, precisei ir ao mercado. Sai as pressas do terreiro e esqueci de tirar as guias (colares coloridos de pedras, conchas ou miçangas). Ao entrar no mercado, uma mulher parou na porta, olhou para mim e fez o sinal da cruz três vezes. E essas situações não são vividas só por mim, tenho certeza de que hoje, nesse momento, alguém passa por algo semelhante.”, relembra Kélida.

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O teólogo Rodrigo também relembra um momento de certa ignorância que passou com outro pastor em um momento de aconselhamento que fazia com uma jovem que foi visitar sua igreja. “Ela estava sofrendo de depressão e já havia tentado suicídio algumas vezes. Meu conselho para ela foi procurar ajuda profissional, terapias e se necessário, até remédios. Enquanto eu falava com a jovem, o pastor dela chegou (não sei como ele também foi parar lá), ele me ouviu falando da terapia e me interrompeu imediatamente dizendo: ‘Eu já falei para ela várias vezes que isso é um problema espiritual, uma feitiçaria que fizeram para ela que precisa ser quebrada com jejum e oração, nada de terapias. É assim que um crente resolve os seus problemas.””, começou.

“Por azar daquele senhor, eu percebi que ele estava usando óculos, e naquele momento eu disse: ‘Para resolver a sua miopia ou astigmatismo, o senhor foi atrás da ciência e confeccionou óculos, não foi? Se ‘crente’ resolve problemas de outras formas, então tire os seus óculos e faça jejum e oração para melhorar a sua vista, ou deixe a garota em paz para fazer a sua terapia.'”, continuou.

Lição de moral

Kélida fez questão de deixar um questionamento para os leitores: “Se você perde tempo criticando algo, como achará tempo para vivenciar sua jornada e sua missão? O ser humano deve voltar mais para si, buscar sua evolução e parar de achar que está preparado para a grande chama de hierarquias celestiais”.

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Para Rodrigo, o principal passo para acabar com a intolerância religiosa é o esclarecimento. Precisamos entender que Deus não tem uma religião, e Ele não pertence a nenhuma delas. As religiões foram criadas para Deus, mas Deus não é propriedade de nenhuma religião.

Luana relembra uma frase que repudia: “Política ou religião não se discute”. Para ela, a sugestão seria substituir por: “Política e religião se discute, sobre o ponto de vista da educação, do respeito e da compreensão”.