Como a fotografia ajudou Sebastião Salgado a superar a depressão?

Sebastião Salgado superou a condição mental com ajuda do seu trabalho e ativismo pelo meio ambiente; fotógrafo faleceu aos 81 anos

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Sebastião Salgado contou com a ajuda de seu trabalho como fotógrafo para superar a depressão; artista faleceu aos 81 anos – Reprodução/Instagram

Morreu, nesta sexta-feira (23), Sebastião Salgado, aos 81 anos. O renomado fotógrafo brasileiro vivia em Paris, na França, e enfrentava problemas de saúde decorrentes de uma malária, adquirida nos anos 1990. Nascido em Aimorés, Minas Gerais, em 1994, Salgado construiu uma carreira que foi muito além da arte: usou a imagem para provocar fortes reflexões sociais e ambientais no mundo e, sobretudo, como uma ferramenta de cura pessoal.

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O início de um novo caminho

Economista de formação, com mestrado pela USP e doutorado pela Universidade de Paris, Salgado atuou na área até 1970. No entanto, foi durante uma missão profissional para a África, que uma câmera fotográfica de sua esposa, Lélia Wanick Salgado, mudou tudo. O que começou sendo um passatempo, se transformou em paixão e, logo, em uma missão de vida.

Em um documentário da Rede Globo sobre sua vida, Sebastião conta que a depressão o atingiu em 1994, quando cobriu o genocídio em Ruanda. “Eu tinha visto coisas tão terríveis em Ruanda que tinha vergonha de pertencer à espécie humana”, declarou. Para tentar se recuperar emocionalmente, retornou às suas origens: foi morar na fazenda, onde passou a infância, no interior de Minas Gerais. Lá, se deparou com uma paisagem devastada, árida, sem vida. A floresta, que mantinha viva na memória, havia desaparecido.

Mudança de vida

Uma alternativa foi sugerida por Lélia, que propôs que o casal replantasse a floresta do local. Em 1998, fundaram o Instituto Terra, uma ONG voltada para o reflorestamento da Mata Atlântica no Vale do Rio Doce. Mais de 600 hectares foram registrados como reserva natural privada e começaram a ser recuperados. Em 2023, o projeto passou a contar com o apoio do governo da Alemanha.

Foi neste processo de cuidar da terra que Sebastião também começou a cuidar de si. A reconexão com a natureza tornou-se seu maior propósito, e a fotografia transformou sua dor em ação.

Imagens em preto e branco

A fotografia, para Sebastião Salgado, era uma ferramenta de reconstrução. Com uma estética marcada pelas imagens em preto e branco e pela luz natural, ele percorreu mais de 120 países ao longo de cinco décadas, documentando as realidades de trabalhadores rurais, refugiados, povos originários e a natureza. Projetos como Trabalhadores,Êxodos e Gênesis tornaram-se referência ao redor do mundo.

Em 2013, explicou sua escolha estética de imagens em preto e branco: “Nada no mundo tem essas duas cores. Mas o fato de eu transformar toda essa gama de cores em gamas de cinza me permitiram fazer uma abstração total da cor e me concentrar no ponto de interesse que eu tenho na fotografia”.

Despedida e legado

Sua trajetória foi retratada no documentário O Sal da Terra (2014), dirigido por Wim Wenders e pelo seu filho, Juliano Ribeiro Salgado. A obra recebeu indicação ao Oscar e eternizou a visão poética e crítica do artista sobre o mundo.

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Em 2024, Salgado anunciou sua aposentadoria das atividades de campo. Ao The Guardian, justificou: “Sei que não viverei muito mais. Mas não quero viver muito mais. Já vivi tanto e vi tantas coisas”, refletiu. “Só me falta morrer agora. Tenho 50 anos de carreira e completei 80 anos. Estou mais perto da morte do que de outra coisa. Uma pessoa vive no máximo 90 anos. Então, não estou longe, mas continuo fotografando, continuo trabalhando, continuo fazendo as coisas da mesma forma”, explicou.