Publicidade
O colunista Carlos Sandano – Divulgação
“Você praça, acho graça. Você prédio, acho tédio”. Quem será que grafitou essa frase pelos muros da cidade de São Paulo? Seja quem for, expressa poeticamente um “não” à especulação imobiliária, gigante insaciável que se alimenta de praças, casinhas, casarões e até monumentos que costumam dar lugar aos arranha-céus. Para o arquiteto austríaco Christopher Alexander, os edifícios elevados não apresentam nenhuma vantagem, pois, em geral, perturbam a paisagem, estimulam o isolamento em casa, debilitam a conexão com a terra, induzem à contemplação
excessiva da TV e criam adensamentos de pessoas, com prejuízos para o trânsito, redes de esgoto e telefone. Além do mais, reduzem a vista, o sol e a ventilação das moradias próximas. Mas vamos com calma, existem opções e soluções.Paris, na França, uma das cidades mais lindas do mundo, é criativa nisso: alguns paredões servem de tela para a arte urbana, recebem desenhos imensos ou jardins verticais. Na primavera, as janelas se enfeitam com jardineiras floridas. 
Paris deve a sua beleza especialmente aos prédios baixos, de poucos andares (lindamente ornamentados, que, com 100 a 300 anos, continuam
agradáveis à escala humana); a um rio limpo e esverdeado (o Sena, que foi despoluído) e às praças incontáveis (mantidas até nas áreas mais valorizadas para que a cidade “respire”). Por lá, não se pode construir grandes supermercados, que ficam na periferia; o pequeno comércio dá um ar acolhedor à paisagem. Estruturas desativadas, como estação de trem ou viaduto, se transformam em áreas verdes, com direito à cafeteria e horta urbana.Na Argentina, em Córdoba, vi outro bom exemplo: a cidade moderna cresceu em volta da antiga, sem destruir as belezas de outros tempos. Alguns dos novos edifícios têm solução diferenciada para cada andar, o que resulta num movimento bonito de fachada, evitando o entediante “prédio-caixote”. Em geral, é possível resgatar o aconchego nesse tipo de apartamento preferindo os andares mais próximos do solo ou que tenham uma varanda utilizável, levando o verde para dentro e para o entorno, fazendo isolamento acústico, preferindo materiais naturais, móveis e objetos que tenham um sentido pessoal.
Meio ambiente não engloba apenas o mundo da natureza, mas também os lugares construídos que falam das histórias e do jeito de ser de cada povo. Se os destruímos, enfraquecemos nossa identidade. Enquanto penso nisso, passo pela rua Congonhas, em Belo Horizonte, onde 11 casinhas estão cercadas para a construção de mais um prédio. Em uma delas, ideal para um centro de cultura, viveu o escritor Guimarães Rosa. Nos tapumes, outro grafite: “Mais prédio, mais tédio”. Sigo pensando que nossas cidades carecem de outros valores que não apenas o de “serem ocupadas”. Onde fica o espaço para as referências e memórias, o verde e o aconchego? “A gente precisa ver”, me responde a frase grafitada num
muro mais abaixo. Concordei. Ver de verdade é entender e a consciência é o primeiro passo para a transformação.

Publicidade