A Onda do Bebê Reborn: Uma Perspectiva Psicológica sobre o Apego Emocional e o Colecionismo Afetivo

Os bebês reborn são bonecas artesanais confeccionadas com materiais como vinil e silicone, pintadas à mão e, muitas vezes, pesadas de forma a simular o peso de um bebê real

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Os bebês reborn são bonecas confeccionadas com materiais como vinil e silicone, pintadas à mão e, muitas vezes, pesadas como um bebê real – Créditos: depositphotos.com / brunomartins246
Nos últimos anos, a popularidade dos bebês reborn — bonecas hiper-realistas que imitam recém-nascidos com impressionante fidelidade — cresceu de forma significativa, especialmente entre adultos. O fenômeno ultrapassa o simples hobby de colecionar bonecas: para muitas pessoas, o bebê reborn representa uma presença emocional concreta, sendo tratado com afeto, cuidado e, em alguns casos, como um verdadeiro filho. Esse comportamento tem despertado curiosidade e também debates, sobretudo no campo da psicologia.

O que são os bebês reborn?

Os bebês reborn são bonecas artesanais confeccionadas com materiais como vinil e silicone, pintadas à mão e, muitas vezes, pesadas de forma a simular o peso de um bebê real. Algumas versões incluem detalhes como veias, marcas de nascença, batimentos cardíacos simulados e até mecanismos de respiração. Apesar de parecer um brinquedo, o bebê reborn é frequentemente tratado como um objeto de afeto, cuidado e vínculo emocional.

Aspectos psicológicos envolvidos

1. Apego e vinculação afetiva

Um dos principais aspectos psicológicos que se destacam no comportamento dos pais de bebês reborn é o apego emocional. Para muitas pessoas, essas bonecas funcionam como substitutos simbólicos — seja de um filho que não pôde ser gerado, de um filho perdido ou de uma maternidade idealizada. O ato de cuidar da boneca pode ativar circuitos neurais associados ao cuidado parental e gerar conforto emocional.

2. Elaboração de perdas e traumas

Há relatos de mulheres que recorreram aos bebês reborn como parte do processo de luto após perdas gestacionais ou infantis. Nesses casos, o vínculo com a boneca pode funcionar como um meio simbólico de expressar e reorganizar a dor da perda. A prática pode ter função terapêutica se inserida em um contexto de acolhimento e acompanhamento psicológico.

3. Regulação emocional e redução da solidão

Em pessoas que enfrentam solidão, depressão ou transtornos de ansiedade, o cuidado com o bebê reborn pode representar uma estratégia inconsciente de autorregulação emocional. O ritual de alimentar, trocar roupas e conversar com a boneca pode proporcionar uma sensação de rotina, companhia e pertencimento.

4. Identidade e papel social

Algumas pessoas relatam uma sensação de ser mãe ao interagir com o bebê reborn. Isso pode refletir a busca por um papel social valorizado ou desejado, especialmente em contextos onde a maternidade é idealizada. A identificação com esse papel pode oferecer à pessoa um sentido de identidade mais estável e de valor pessoal.

5.Colecionismo e estética

Nem todos os colecionadores desenvolvem um vínculo emocional com os reborns. Para alguns, a motivação está mais ligada ao aspecto artístico e estético. O colecionismo também pode funcionar como uma forma de controle, organização e prazer em criar um universo pessoal em torno de um objeto que representa algo significativo.

Como a psicologia pode compreender esses comportamentos?

É importante destacar que os comportamentos associados aos bebês reborn não devem ser automaticamente patologizados. A psicologia busca compreender o contexto e o significado dessas ações na vida da pessoa. Quando esse vínculo com a boneca oferece alívio, conforto ou simboliza um processo de cura, ele pode ser visto como uma forma de enfrentamento adaptativo.
Entretanto, se o uso do bebê reborn impede o indivíduo de estabelecer vínculos reais, se isola excessivamente da realidade ou representa uma recusa de lidar com perdas reais de forma saudável, pode haver indicativos de sofrimento psíquico que merecem atenção.

Conclusão

A onda dos bebês reborn nos convida a refletir sobre os modos contemporâneos de lidar com o afeto, a solidão, a perda e os papéis sociais. Longe de ser um fenômeno meramente curioso, esse comportamento toca em temas profundos da experiência humana — como o desejo de cuidado, a maternidade, o luto e o valor simbólico dos objetos. Cabe à psicologia investigar sem julgar, acolher com escuta ativa e, quando necessário, intervir com ética e empatia.
*Texto da psicóloga Rosana Cibok, de CRP 06/141653

 

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Editora e repórter da Bons Fluidos. A jornalista já passou pelo Estadão, Band e AnaMaria Digital