Alterações cerebrais estão associadas a maior risco de depressão pós-parto
Estudo aponta que mulheres que desenvolveram o problema tiveram aumento de volume em duas áreas do cérebro envolvidas em emoção e estresse

Estudo aponta que mulheres que desenvolveram o problema tiveram aumento de volume em duas áreas do cérebro envolvidas em emoção e estresse
A transição para a maternidade envolve uma transformação hormonal profunda em todo o corpo da mulher, incluindo o cérebro. Mudanças sutis em algumas regiões cerebrais durante a gravidez podem ajudar a explicar por que algumas mães desenvolvem depressão pós-parto. Um novo estudo, publicado na revista Science Advances, constatou que aquelas que apresentaram esse quadro mental tiveram aumento de volume em duas áreas envolvidas com emoções e estresse: as amígdalas e o hipocampo.
Essas estruturas são essenciais para a regulação emocional e a formação da memória. No entanto, ainda não se sabia se as experiências no parto e o desenvolvimento dessa depressão estariam associados a mudanças nessas regiões cerebrais. E foi isso que pesquisadores vinculados a diferentes instituições da Espanha investigaram no estudo recente.
Os cientistas usaram exames de ressonância magnética para avaliar regiões do cérebro de 88 mulheres que estavam grávidas pela primeira vez e não tinham histórico de transtornos de saúde mental. Eles buscaram especialmente mudanças de volume no hipocampo e nas amígdalas. Elas também responderam a um questionário sobre sua experiência no parto. No grupo controle, outra 30, que nunca tiveram filhos, foram monitoradas.
Os pesquisadores ressaltam que o estado psicológico da mãe molda o nascimento em uma experiência profundamente subjetiva. Enquanto algumas mulheres percebem seu parto como um momento positivo, sentindo intensa alegria, orgulho e realização, outras o descrevem como traumático. Por isso, uma concepção angustiante e complicada pode levar a sintomas de estresse pós-traumático ou depressão pós-parto.
Aquelas que vivenciam situações ruins apresentaram crescimento bilateral no hipocampo. E mulheres que manifestaram sintomas do transtorno durante o periparto (que inclui o período final da gravidez e os meses seguintes após dar à luz) estavam com a amígdala cerebral direita aumentada. Segundo o estudo, quanto maior é o ampliação do volume dessa área, mais intensos são os sinais de depressão perinatal; Além disso, quanto pior a experiência do parto, maior o aumento bilateral do volume no hipocampo.
“Esse achado é muito importante”, afirma o ginecologista e obstetra Rômulo Negrini, coordenador médico materno-infantil do Hospital Israelita Albert Einstein. “Os autores frisam a correlação da amígdala direita com a depressão pós-parto porque essa é uma condição que requer tratamento. A questão dos acontecimentos da concepção é muito individual e merece uma atenção psicológica. Mas o transtorno pode ser algo mais grave e permanente.”
De acordo com a pesquisa espanhola, entre 7% e 44% das mães descrevem seu parto como traumático, 10% desenvolvem transtorno de estresse pós-traumático relacionado ao nascimento do filho e 17% sofrem de depressão pós-parto. No Brasil, segundo estimativas da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), o quadro afeta cerca de 25% das mães.
Logo após darem à luz, cerca de 80% das mulheres vão vivenciar o baby blues — conjunto de sentimentos que costuma ser confundido com a doença: choro constante, tristeza, angústia, excesso de sensibilidade, irritabilidade e ansiedade são alguns dos sintomas. Mas eles são transitórios, duram de duas a três semanas e costumam regredir espontaneamente. A depressão pós-parto, ao contrário, não desaparece e pode trazer outras complicações e consequências, inclusive no aspecto afetivo, atrapalhando o vínculo entre mãe e bebê.
Os resultados do levantamento ainda não trazerem uma mudança efetiva na prática clínica. Isso porque não dá para fazer ressonância magnética em todas as mulheres grávidas. Entretanto, as descobertas reforçam a importância de monitorar as experiências perinatais e a saúde mental da gestante durante o pré-natal.
“Se há um alto risco da doença, posso fazer o exame logo após o parto e detectar essas alterações cerebrais antes dela aparecer, por exemplo”, propõe Negrini. “A partir disso, posso tomar atitudes preventivas, como fazer psicoterapia, organizar o estilo de vida e manter uma rede de apoio para que essa mulher não desenvolva depressão.”
*Texto de Agência Einstein