Publicidade

A cura do estilo de vida

Confira três capítulos adaptados do livro A Ciência da Cura , do médico Luís Carlos Silveira, há mais de 30 anos à frente do Kurotel Centro Médico de Longevidade e Spa – um dos seis melhores do mundo

A cura do estilo de vida – Shutterstock
Esqueça o tempo que atropela, recupere o ritmo da respiração, permita-se viver suas emoções. Na opinião do clínico geral e especialista em nutrologia Luís Carlos Silveira, a medicina do estilo de vida, que integra corpo, alma e emoção é o que realmente leva ao bem-estar. 
Em linguagem simples e direta, porém afetuosa, seu novo livro A Ciência da Cura – Os Segredos da Filosofia do Kurotel para Ajudar Você a Viver Melhor (ed. Gente), lembra a visita de um antigo médico de família, misto de psicólogo, ouvinte, amigo e, claro, especialista nos males do corpo. 
A “conversa” é direcionada para esclarecer sentimentos que levam a diferentes tipos de mal-estar e apontar comportamentos, hábitos e mentalidades que tendem a facilitar a melhora – lembrando sempre de fornecer as chaves para o leitor acessar a mudança que se faz necessária, especialmente no que se refere à prevenção, prática compartilhada com os mais de 20 mil pacientes que já passaram pelo Kurotel. “Se a arte de tratar doenças é importante na vida do indivíduo, a prevenção é muito mais. Ela é tão antiga quanto a própria medicina, embora não tenha sido tão valorizada quanto deveria”, diz o autor. A seguir, o primeiro capítulo adaptado.
“Estresse” é um termo comum na engenharia e na física de materiais. Tem a ver com tensão e desgaste de corpos. De maneira resumida, define-se como uma resposta física e mental gerada por certos estímulos externos.
 Essa resposta permite ao indivíduo superar crises, barreiras e algumas exigências no meio ambiente. Em contrapartida, esse estado, no limite do descontrole, é também responsável por intenso desgaste físico e mental no indivíduo. 
O desgaste gerado pelo estresse compromete o organismo em várias dimensões e vários segmentos. Lembro-me de um representante de laboratório farmacêutico que conheci nos anos 1970 que poderia ter sua personalidade classificada, conforme alguns conceitos médicos, como tipo “A”, isto é: muito ativo, fala rápida, impulsivo, ansioso, movido por trabalho contínuo, hiperativo, compulsivo, que despreza o descanso e não divide responsabilidades. Para esclarecer o ponto que quero demonstrar, lembro que esse “A” pode ser associado à fi gura do tipo “apressado”; assim como, por outro lado, uma personalidade “B” poderá ser associada a um tipo “bonachão”, isto é, calmo, sossegado. 
Ninguém é 100% “A” nem 100% “B”. Todos temos tendências aos dois traços, com a predominância de um sobre o outro. No entanto, a grande maioria das pessoas que vai parar em um pronto-socorro cardiológico tem o perfil do tipo apressado. 
Voltando ao caso do representante, naquela ocasião ele visitava um cardiologista cujo consultório fi ava dentro de um hospital. Enquanto esse representante esperava na recepção para ser atendido, ele começou a organizar seus papéis, sua agenda e a ler sua correspondência – como ele nunca tinha tempo para si e para os próprios assuntos, aproveitava esses pequenos intervalos para se organizar; isso nós soubemos mais tarde. Numa dessas correspondências ele encontrou um relatório do laboratório para o qual trabalhava, em que a meta de vendas para aquele mês havia aumentado muito. Então, por razões diversas, seria praticamente impossível para ele, naquele momento, atingir a nova meta, pois ele mal conseguira cumprir a meta anterior, que já era alta e bem difícil de ser atingida. O impacto dessa nova informação foi demais para ele. O coração não suportou. 
O fato foi muito marcante para mim. Levaram-no imediatamente para a sala de cirurgia, mas infelizmente nada mais se pôde fazer. Eu conhecia bem esse profissional. Ele me visitava no consultório, era uma pessoa com imensos projetos e grandes expectativas que foram interrompidos por uma descarga emocional tão grande que nos faz questionar até o modelo de vida que estamos seguindo. 
Acumulo de descuidos e falta de cuidados com o corpo e a vida
Mencionei o caso do propagandista de medicamentos para ilustrar a dimensão da agressividade do estresse. É claro que as coisas não acontecem de um momento para o outro, ninguém sofre um ataque cardíaco simplesmente porque recebeu uma notícia de impacto. Isso é muito raro. Na verdade, essas coisas acontecem ao longo do tempo, são um acúmulo de descuidos, de falta de atenção para com o próprio corpo, para com a vida, de maneira geral. O que acontece nesses casos é que um limite foi ultrapassado, e não foi possível resistir.
É fundamental, portanto, saber manejar o estresse, saber lidar com ele, pois só com esse conhecimento poderemos diminuir a agressividade dele no organismo.
Existem várias técnicas para isso, muitas delas orientais e, algumas, tidas até como não científicas, mas reconhecidamente saudáveis, como a ioga e o tai chichuan, entre alguns movimentos meditativos. O relaxamento muscular progressivo também ajuda, assim como o mind control (adestramento da mente), a meditação, o watsu (massagem na água), a terapia comportamental cognitiva e focal, em que, basicamente, um profi ssional interage com o indivíduo, sugerindo-lhe novas posturas, outros meios de olhar um problema, mudanças de atitude, mas de tal forma que façam com que a própria pessoa tenha essa percepção e se dê conta da necessidade de mudanças.Os meios, portanto, existem, estão disponíveis, mas é preciso reconhecer o problema. 
Outro método importante na prevenção do burnout (esgotamento) é a neuropsicologia. Esse ramo da neurociência nos ajuda a trabalhar e analisar os aspectos e as relações entre cérebro, neuroanatomia e comportamento humano. Já a terapia cognitiva trabalha aquilo que definimos como qualidade do pensamento, um meio em que se busca ajustar ou realinhar padrões de emoção, pensamento e conduta. Há várias linhas de ação na terapia cognitiva, entre elas a comportamental, que é uma das que usamos bastante. Temos, aliás, no Kurotel, um centro de controle do estresse, com salas repletas de estímulos visuais e sonoros, todos altamente relaxantes, que levam à redução da ansiedade e trazem, por consequência, mais equilíbrio e relaxamento emocional. 
O desligamento dos agentes estressores é fundamental para restabelecer o equilíbrio e permitir que suas emoções se acalmem. 
Nosso ponto é ajudar a pessoa a descobrir o que ela pode fazer para se sentir melhor. Se as pessoas não ampliam seu repertório, ficam confinadas a alternativas limitadoras, imediatistas e, quase sempre, prejudiciais.
Até porque muitos desses distúrbios não estão sozinhos. A ansiedade é uma das faces do estresse, assim como a angústia e a depressão. Muitos desses nossos pacientes são conhecidos como workaholics, viciados em trabalho. São aqueles executivos violentamente pressionados que acabam pondo o trabalho à frente de tudo na vida. É curioso dizer isso, mas muitos desses profissionais costumam ser os melhores em suas áreas, porém pagam um preço muito alto por suas posições, indo até o limite de sua saúde (física e mental), porque têm a ideia de que a pressão é um componente “natural” desse processo. O que eles desconhecem é que são viciados em adrenalina. 
A adrenalina é um hormônio secretado pelas glândulas suprarrenais, que ficam acima dos rins. Em situações de estresse, essas glândulas liberam grandes quantidades desse hormônio, relaxando certos músculos e contraindo outros, a fi m de preparar o organismo para grandes esforços físicos, além de estimular o coração e elevar a pressão arterial. Contudo, esse não é o único problema. Nossa atual geração também está viciada em dopamina, que é um neurotransmissor – e não um hormônio. Esse neurotransmissor é liberado no córtex pré-frontal toda vez que a pessoa tem algum tipo de prazer, seja pela comida, pelo álcool, pelo fumo, pela droga, pelo jogo, pelo trabalho. Entretanto, sua ação é rápida, há uma descarga e depois uma queda. Quando isso acontece, acaba o prazer, e a pessoa então começa a procurar alguma outra atividade que possa reproduzir aquela sensação. A dopamina é diferente da serotonina – outro importante neurotransmissor, também conhecido como o “hormônio da felicidade”. A dopamina, portanto, está voltada para a “alegria” e o “prazer” imediatos, enquanto a serotonina está voltada para a “felicidade”, por ser mais perene.
Um exemplo que ilustra bem como isso funciona pode ser encontrado numa situação comum hoje em dia. Com o desenvolvimento de aplicativos e programas para celulares, a comunicação no mundo virtual é quase uma realidade paralela em nossa vida. Um simples sinal, um ruído qualquer no celular ou no tablet, é sufi ciente para liberar algumas gotas de dopamina. É uma situação que lembra um pouco aquele clássico exemplo do comportamento respondente condicionado (bem descrito na literatura behavorista): o celular emite um sinal (ou qualquer ruído musical) e a sensação de prazer é imediata: “Quem será? Qual será a mensagem ou o e-mail? Quem quer ou precisa falar comigo?”. Nesse ponto, há descarga de dopamina. No entanto, essa sensação vem acompanhada por uma ansiedade muito grande e permanente. Se a pessoa está dirigindo, se está numa reunião ou simplesmente no meio de um jantar em família, o celular pulsa, emite qualquer ruído, ela já fica alerta. A sensação prazerosa passa, mas o estresse, não; a ansiedade, não. Eles são constantes, vêm aumentando, e, nesse sentido, trazem muitos prejuízos para a saúde. 

Nosso grande desafio é justamente mudar esse entendimento de que tudo é urgente. Não é.
Orientações práticas
1) Sono da noite: evite estímulos duas horas antes de dormir e vá para a cama sem material de trabalho, televisão ou discussões. O sono é de fundamental importância para o ajuste de hormônios e neurotransmissores e ajuda na qualidade do humor. Faça a si mesmo três rápidas perguntas: a) Acordo sempre cansado? b) Nunca sonho ou não lembro dos sonhos? c) Dizem que ronco ou acordo com meu próprio ronco? Se alguma dessas perguntas tiver resposta afirmativa, possivelmente a qualidade do seu sono não está sendo tão adequada e você pode obter melhoras, além das medidas mencionadas, conversando com um profissional da saúde. 
2) Sono do dia: realize sesta de até 20 minutos após o almoço. Isso pode ser feito em casa, ou até mesmo no escritório, se for viável. Avise as pessoas para não ser perturbado durante esse período.
3) Café, sim, mas nem tanto: embora o efeito seja relacionado aos seus genes e, portanto, individual, prefiro recomendar consumir no máximo duas bebidas ou alimentos cafeinados por dia e sempre antes das 17 horas. 
4) Reduza o consumo de álcool e pare com o tabagismo: essas substâncias têm um pseudoefeito de relaxamento. Passados alguns segundos, minutos ou horas, o sistema nervoso central reage com um rebote excitatório, o que aumenta significativamente o estresse.
5) Proteja a agenda: avise que do horário “X” ao “Y” você não se encontra disponível. Se você não deixar claro para as pessoas à sua volta que não estará à disposição, sempre será interrompido. A recomendação é que tenha pelo menos uma hora por dia para si mesmo (com atividades diversas que não sejam laborais) e uma hora por dia para atividade física.
6) Desfrute do tempo livre: mantenha esse tempo reservado para ser aproveitado da maneira como desejar. Pode ser lendo um livro, assistindo a um filme (e segundo a literatura, os de comédia são os mais recomendados para a redução do cortisol), plantando, cantando, dançando ou mesmo apenas exercendo o ócio. Sem culpa! 
7) Esteja presente de fato: exercite a atenção plena a pequenos e diversos períodos do dia. Por exemplo, quando estiver esperando o elevador, preste atenção absoluta à sua postura, à temperatura e à umidade do ar, à luminosidade à sua volta, ao andar em que o elevador está. Nesse momento, o exercício é ficar plenamente no presente, é um tempo para não pensar no que fez nem no que vai fazer. 
8) Exercício físico: manter uma frequência de exercício físico regular ajuda a reduzir os níveis sanguíneos de cortisol. 
9) Preste atenção à sua respiração, pense: “Como estou respirando?”. Essa pergunta já é, por si só, extremamente útil para fazer a correção de algum padrão respiratório disfuncional ou pouco saudável. Quando nos perguntamos, instantaneamente modificamos o padrão de respiração para melhor, deixando o tempo de inspiração e de expiração mais lentos e usando mais adequadamente o diafragma como condutor do ciclo respiratório, o que, na prática, identifica-se pelo aumento da expansão torácica, mas, especialmente, abdominal. Sugiro que faça essa pergunta a si mesmo várias vezes ao dia.
 10) Relaxamento e meditação: essas técnicas são fundamentais para a redução dos hormônios relacionados ao estresse e a melhora e a estabilidade do afeto (humor). 

Publicidade