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Sheila Alvarado – Musuk Nolte

A maioria de nós, brasileiros, conhece pouco a cultura latina, e tanto menos suas particularidades. O Peru, por exemplo, tão pequeno em extensão, mas tão vasto em diversidade. Sheila Alvarado, uma jovem artista plástica de Lima, tem feito, no entanto, um interessante alinhavo das tradições nacionais. “Dizem que não podemos amar aquilo que não conhecemos. Nesse ponto, tive muita sorte. Meu pai é da província de Huanuco, na serra, e mina mãe, de Ica, na costa. E isso me fez crescer com diferentes tradições e ter uma atração pelo pluricultural em que nasci. O Peru tem muitas línguas, nações, além da variedade geográfica (a costa, a serra e a selva)”, detalha. 

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Artista plástica, ilustradora e escritora, Shila procura entrelaçar essa riqueza em seu trabalho – um olhar contemporâneo e de admiração a essa cultura que é um dos berços da civilização. “Tenho 36 anos e vivo na capital. Aqui o céu é branco como papel e, no inverno, faz você perder a noção do tempo – você se levanta e não sabe se são 10h, 13h ou 15h. Quase não há nuvens, chuva, apenas uma pequena garoa. E de alguma maneira essa estranheza do clima tem me ajudado a apreciar outros céus e climas.”
Inspirada em contos, lendas e nos diferentes ritmos musicais locais, Shila revela a força da feminilidade. Suas pin-ups estão numa busca constante de independência e autoaceitação, outras ilustrações encantadoras (como as destas páginas) valorizam a figura cálida e sensível da mulher. “Essa é a voz que eu conheço e de quem tiro a franqueza para falar dos meus sonhos, desejos e medos”, diz. Como mostra uma exposição recente que apresentou no Centro Cultural Ricardo Palma, no bucólico bairro de Miraflores. Um conjunto de desenhos que, nas palavras da curadoria, “apagam as fronteiras entre ilustração, conto e poesia. Confundem disciplinas, as entrelaçam, potencializando-as para criar uma obra comovedora e fresca”. 
No trabalho, chama particular atenção os cabelos. Shila tem um profundo interesse pela importância das tranças na identidade peruana. “O mais interessante sobre é que são algo que você pode levar consigo e que passam uma mensagem que vai mais além do que qualquer acessório pode transmitir. A forma como você as usa, o trançado, pode explicar de que lugar da sociedade você vem, se está solteira, buscando um noivo, se é casada, se tem filhos.”
A própria fi gura da artista desperta a curiosidade pelos fi os de cabelo (quase todos azuis) de 1,10 m. “É uma aposta política. Não é muito comum entre as mulheres da costa, de um certo nível social, usarem cabelos tão longos. Por isso mesmo, é um vínculo que estabeleço – e faço questão de manter – com um outro tempo. Várias décadas atrás, quando as mulheres da serra migraram para Lima, tiveram as tranças cortadas como uma maneira simbólica de romperem com a cultura ancestral. Ao deixar o meu cabelo comprido, me aproximo dessas mulheres que são parte da história desse país”, enaltece. Há poesia nesse discurso. Há independência. Há ternura.
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