Em Catuçaba, próxima à São Luiz do Paraitinga, no interior de São Paulo, Peèle e Yentl mostram que é possível morar no campo e trabalhar à distância. Com qualidade
Se você mora em uma cidade grande, provavelmente já sonhou em algum momento se mudar para bem longe. Fugir da bagunça e da confusão, gastar menos dinheiro. Ter talvez um sítio no meio do mato, plantar e colher seu próprio alimento. Morar em uma casinha caiada e levar uma vida mais tranquila. E pode ser que tenha desistido do desejo por questões práticas que acabam inibindo a vontade, pelo menos a curto prazo: é possível ganhar dinheiro num lugar como esse? Como ficar longe dos bons restaurantes, da vida cultural e dos amigos?
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Os publicitários Paulo Lemos – mais conhecido como Peèle – e Yentl Delanhesi, passaram por tudo isso. Só que a vida deu um empurrãozinho para que realizassem o sonho. Peèle nasceu no Vale do Paraíba e logo mudou com a família para o interior de Goiás, onde desfrutou a infância. Yentl nasceu em Porto Alegre, mas sempre teve um contato muito forte com a natureza. Os dois se conheceram em São Paulo quando trabalhavam em uma agência de propaganda. Logo perceberam que tinham em comum a curiosidade por lugares diferentes e formas alternativas de viver. Começaram a morar juntos e, quase por impulso, compraram um sítio para passar os fins de semana em Catuçaba, cidadezinha próxima à São Luiz do Paraitinga – por ser relativamente perto da capital paulista e, ao mesmo tempo, guardar características de um interior cada vez mais raro. Dizem que Catuçaba é o último reduto caipira do estado.
Acontece que logo depois da compra, Peèle recebeu uma proposta para trabalhar em uma agência de propaganda em Miami. O casal se mudou para a cidade americana e acabou ficando por dois anos. Na sequência, transferiu-se para Los Angeles por mais um tempo. Ambos trabalhando como freelancers. A ideia era ficar por lá. Durante esse período nos Estados Unidos, contudo, eles começaram a perceber que o fato de estarem longe não impedia que tivessem bastante contato com os amigos do Brasil. Nem atrapalhava a vida profissional, pois o formato de trabalho nos EUA já era remoto e feito de uma maneira tranquila. A experiência mostrava que morar em uma área mais rural e trabalhar à distância seria possível em qualquer lugar… Até no Brasil. E passaram a alimentar a possibilidade de voltar, não mais para São Paulo, mas diretamente para o campo. Como não tinham experiência com a vida na roça, exceto as lembranças de infância, resolveram se preparar um pouco mais enquanto ainda estavam no exterior. “Yentl trabalhou como voluntária em uma horta orgânica e eu fiz cursos em uma fazenda próxima a Los Angeles. Aprendi, entre outras coisas, a fazer queijos com leite de cabra”, conta Peèle. Um ano atrás, Bernardo Paz, idealizador do centro de arte contemporânea Inhotim, em Brumadinho (MG), os chamou para propor novos modelos de desenvolvimento para o parque. Foi o impulso que faltava para o casal voltar de vez. Para desenvolver um trabalho mais conectado à realidade e às necessidades do lugar, moraram dentro do Inhotim até concluírem o trabalho. E dalí partiram definitivamente para Catuçaba. Quando compraram o sítio, a única benfeitoria que havia era uma casinha centenária de cerca de 70m2 com dois quartos, um banheiro e uma sala integrada à cozinha. “Para poder mudar, refizemos a parte elétrica e hidráulica renovamos as instalações do banheiro e adicionamos um forro para proteger do frio. Também instalamos janelas do tipo guilhotina e reformamos o forno à lenha”, detalha o morador.
A decoração dos ambientes é minimalista e pessoal. Os tampos da mesa da sala e da bancada do banheiro, por exemplo, foram desenhados por Peèle e executados por um senhor que utiliza apenas madeira de árvores que caem naturalmente. “A estética é muito importante pra gente porque dá a ‘melodia’ do lugar. Então, estamos o tempo todo mexendo nos objetos, colocando ou tirando um acessório, às vezes, que encontramos no sítio, por exemplo”, diz Yentl. Para trabalhar à distância, o maior desa o foi conseguir instalar uma conexão de internet. Foram três meses até descobrir como fazer: a saída era colocar uma conexão por rádio. Hoje em dia o casal tem uma empresa de consultoria chamada Niiez. Se comunicam por e-mail e fazem a maior parte das reuniões virtualmente. Uma vez por mês pelo menos, eles saem para as reuniões presenciais. Pode ser em São Paulo, Inhotim ou até Los Angeles, onde mantêm contatos profissionais e amizades.
No sítio, eles captam a água de uma nascente, além de plantar e colher o próprio alimento. Agora estão construindo um galinheiro com a ajuda do Joãozinho, o caseiro. A mistura do dia a dia no campo com o trabalho realizado de longe deu a Peèle e Yentl uma rotina harmônica e próxima à natureza que não pára de dar frutos. “A vida na roça parece não ter novidades. Mas sempre rola uma visita inesperada, um convite para um café, uma chuva que vem para fazer a gente dar uma aquietada”, afirma Peèle. Esses ensinamentos, o casal leva para a consultoria e acaba inserindo nos trabalhos tão singulares que desenvolve para a gente da cidade grande.
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